*Enviado-especial ao Brasil

Entrar numa pequena loja em Belo Horizonte e tropeçar em pastéis de Belém, queijadas de Sintra ou pastéis do Convento de Coimbra? Não é impossível. É, aliás, até provável, uma vez que existe na capital de Minas Gerais um pequeno franchising que vende, apenas, doçaria de Portugal. O nome diz tudo: Doces de Portugal.

A dona é, também ela, portuguesa. Maria Fernanda Affonso está em Belo Horizonte há 40 anos, tendo vindo para o Brasil a partir de Angola, onde estava com a família. Mudaram-se a seguir ao 25 de abril, com a saída de muitos dos portugueses que se encontravam no país, então uma colónia.

Chegou ao Brasil com o curso de engenharia química por concluir e a necessidade de encontrar uma vocação. Nunca pensou que seriam os doces.

«Aconteceu por acaso. Eu não sabia fazer nada. Ninguém na minha família tinha, alguma vez, trabalhado com comércio. Aprendi com uma senhora, a Dona Helena, que aqui chamamos banqueteira», conta Maria Fernanda, em conversa com o Maisfutebol.

Emocionada por ouvir falar o português que lhe traz de volta memórias da infância, a empresária acrescenta depois um dado curioso à história que lhe mudou a vida: «A interessada nem era eu. Era uma amiga. Eu só comecei a acompanhá-la. Fui lá uma ou duas vezes e as coisas começaram a sair bem. Isso empolgou-me.»

«A minha amiga nunca abriu loja nenhuma. Eu tenho três e no início de julho vamos abrir a quarta. Tudo em Belo Horizonte. Pedem-me muito para fazer uma franquia para outras cidades, mas para a alimentação é muito complicado», sublinha.

Estivemos na loja da rua Santa Rita Durão e o cenário transpirava Portugal. Pasteis de nata, pasteis de Santa Clara, quindins, travesseiros. Até bolo-rei. Na parede a imagem de um Galo de Barcelos.

Gabriel Schmitt, empresário que degustava um pastel de Santa Clara, é cliente assíduo. «Não digo habitual porque não venho todos os dias, mas venho muitas vezes. Nunca fui a Portugal, mas por esta amostra, ando a perder muita coisa», atira, entre risos.

Maria Fernanda acha precisamente o mesmo: «Através dos meus doces as pessoas estão a conhecer Portugal e eu tenho um orgulho enorme nisso. Tenho um enorme orgulho no meu país.»

E lança o repto para os compatriotas. «Acho que os portugueses são muito modestos. Um italiano, de uma massinha e um molho de tomate, faz um manjar dos deuses. Nós somos tão ricos em tanta coisa e não mostramos isso ao mundo. Ficamos sempre no nosso cantinho. Acho que agora os jovens estão a mudar um pouco isso», comenta.

Procurada também por descendentes de portugueses, o Mundial tem sido naturalmente tema de conversa, entre bolos, cafés e sumos. Graça Ramalho é neta de portugueses, mantém contacto com a família em Portugal e está dividida.

«Nasci no Brasil, o meu pai veio para cá ainda muito jovem à procura de melhores condições para viver. Sinto-me brasileira, quero que o Brasil vença. Mas gostava que Portugal estivesse bem. Uma final entre os dois acho que é o sonho de todos», refere.

E os bolos? «Deliciosos!», diz, com um largo sorriso. «É das melhores coisas de Belo Horizonte. Devia até ganhar Prémio Nobel», comenta em jeito de piada.