Passou uma semana desde que a festa de aniversário de Cristiano Ronaldo originou um caso em Madrid. Daí para cá, quase todos os que lhe são próximos ou dele dependem, de Jorge Mendes a Ancelotti, passando por várias vozes da FPF, vieram a público assumir a sua defesa e lembrar a folha de serviços de um profissional exemplar, para todos os que já trabalharam com ele. Foi a resposta, esperada e no tempo certo, de uma máquina de comunicação que, muito justamente, protege e valoriza o que é seu. Assim, dado não faltar quem diga bem de tudo o que é feito em nome de CR7, sigo outro caminho.

Porque a resposta coletiva está certíssima, mas a pergunta que a originou está errada: se os ecos da festa puseram alguma coisa em causa não foi o profissionalismo do jogador. Foi, sim, a falta de sensibilidade, ou de previsão, da estrutura que o rodeia, incapaz de travar a transformação de uma festa, supostamente familiar e privada, num evento mediático. E todas as circunstâncias, da expulsão disparatada em Córdova à maior derrota em dérbis dos últimos 28 anos, passando pelo histórico recente com o Atlético, aconselhavam essa prudência.

A questão com peso, aqui, não é se Ronaldo é um excelente profissional – claro que é. Nem se tinha todo o direito de festejar uma data marcante em noite de folga – claro que tinha. Mas, sim, quantas mais vezes a gestão da marca global Cristiano Ronaldo, estrela dependente do buzz que gera e dos eventos sociais que promove, vai voltar a passar rasteiras ao jogador que a criou. E criou-a, lembre-se, graças ao talento incomparável, à dedicação extrema ao que faz e à incapacidade de conformar-se com as derrotas.

Não ajuda o facto de o caso ter coincidido com a já recorrente baixa de rendimento, após a decisão da Bola de Ouro. Mas claro que os adeptos do Real serão os primeiros a esquecer tudo isto, a partir do momento em que, num destes dias, Ronaldo der a resposta habitual dos últimos anos, decidindo um jogo, e depois mais outro e outro, com um, dois e mais golos de classe.

PS: Ajuda, sim, à confusão o uso reiterado de uma decisão íntima de Cristiano Ronaldo – a de jogar em Moscovo pela seleção, no dia em que perdeu o seu pai - como exemplo máximo de profissionalismo. Lembremos o óbvio: é sempre uma pessoa – apenas uma pessoa, não uma figura pública, não um ícone - que está em causa perante a morte, a família e os afetos. Nessa tarde, Cristiano decidiu jogar porque só ele podia tomar essa decisão. Que não o torna melhor ou pior: apenas nos merece o mais profundo respeito. Como mereceria a decisão contrária. Avaliar essas opções ou sugerir que será menos profissional quem decidir não jogar perante essa situação limite, é próprio de quem tem uma enorme bússola moral. Invejo quem a exibe orgulhosamente. Mentira: não invejo nada.